Começaram
a tramitar nas varas do trabalho ações em que os empregadores visam a
transferir os ônus da dispensa de seus empregados por
causa do Covid-19 para estados e municípios. Nesse sentido, empresas de dois grandes grupos empresariais
– um do ramo de churrascaria e outro de investimentos – decidiram atribuir aos
governos dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e do Distrito Federal, a
responsabilidade pela dispensa de trabalhadores, alegando o fato do príncipe.
Nesses
casos, a defesa das empresas baseia-se nos artigos 486, o qual enfoca o factum principis (uma hipótese de “dano
fatal” causado por outrem, logo força maior) e 501, ambos da Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT).
Relevante
destacar que o fato do príncipe está previsto na CLT desde 1943 e a força maior
regulada no art. 1058 do Código Civil de 1916 (hoje no art.
393 e seu parágrafo único do novo código). Então, a CLT não poderia sair deste limite já que a força
maior se trata de um instituto de direito civil. Daí o legislador trabalhista
ter apenas especificado um caso de força maior (o fato de príncipe) sob o enfoque
do direito do trabalho (art. 501, CLT).
A
jornalista Maria Cristina Fernandes revelou na edição de
20/5 do Valor Econômico, que tramita no Tribunal Regional do Trabalho da Quinta Região (BA),
processo cujo tema da defesa é o fato do príncipe. Nesta lide, o Sindicato dos
Trabalhadores em Empresas Intermunicipais de Transportes Rodoviários baiano
pretende reverter a dispensa sem justa causa de diversos empregados da
empresa Marte Transportes Ltda. em reintegração e, sucessivamente, na suspensão
dos contratos de trabalho e percepção do benefício emergencial, conforme previsto na Medida
Provisória nº 936/2020. Embora a empresa ré tenha efetivada a rescisão dos
contratos com fundamento no fato do príncipe, a juíza da causa entendeu que se
acham presentes no caso os requisitos da probabilidade do direito pleiteado e o perigo
da demora e concedeu a tutela de urgência (art. 300, do CPC).
Havendo
previsão legal a respeito de como o empregador pode evitar as consequências –
ou pelo menos minimizá-las – motivadas pela paralisação temporária ou
definitiva do trabalho por força de lei ou ato de autoridade pública (aqui o novo coronavírus),
creio ser inviável a preponderância da tese do factum principis. A jurisprudência trabalhista a esse respeito ainda
é embrionária, mas, ao que tudo indica, o fato novo (emergência de saúde
pública pela pandemia do Covid-19) trará aos tribunais regionais trabalhistas e
ao Tribunal Superior do Trabalho (TST) um número elevado de processos e, dado o
imperativo de rápido posicionamento das cortes trabalhistas, o entendimento predominante será firmado em pouco tempo.